quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Sobre a transferência da Jerónimo Martins para a Holanda

Declaração prévia de interesses:
a)
Tenho "telhados de vidro" (nem sempre peço fatura de tudo o que compro, por exemplo) quanto a fugir de pagar impostos;
b) Apenas respondo perante a minha consciência e esta, apesar de uma sólida educação familiar e católica (... a César o que é de César, disse o sábio dos sábios), nos últimos tempos tem vindo a caminhar no sentido de um maior neoliberalismo.
Feita esta declaração de interesses, os meus comentários são de apoio quando considero que o devo fazer, são de crítica idem.

Pessoalmente não partilho da inveja e maledicência anticapitalista nacional, desportos muito em alta sobre esta temática. Na mesma linha de raciocínio, é-me absolutamente insofismável o caráter empreendedor de Alexandre Soares dos Santos e da sua família, quer na Polónia, na Colômbia ou em Portugal, associado à objetiva Responsabilidade Social (até por ser um grande empregador, promotor e comprador de produtos nacionais). Económica e legalmente a decisão é inatacável - se há um país onde a atratividade fiscal é melhor, é obrigação de um gestor transferir a sua empresa para lá: assim o determinam os seus acionistas!
Também não me admiro que que o faça, pois várias empresas já o fizeram: quase todas as principais cotadas na Bolsa de Lisboa têm lá a sede ou uma filial, para beneficiar dos mesmos benefícios fiscais - s
e a memória não me falha, o Grupo SONAE tem várias empresas sedeadas na Holanda; a SOMAGUE foi vendida aos espanhóis da Sacyr Vallehermoso dias após o seu CEO, Diogo Vaz Guedes, ter feito um bonito discurso no Compromisso Portugal; Américo Amorim trocou o seu banco BIC por uma participação no Banco Popular - estes são alguns exemplos da memória recente.
Porquanto ser-me claro três aspetos:
1) A decisão é economicamente inatacável;
2) O nosso país, há já muito tempo
, não tem uma política competitiva de captação e manutenção de Investimento Direto Estrangeiro, pelo menos no espaço europeu;
3) Não é de admirar que a dimensão fiscal seja um dos pouquíssimos pontos onde os Estados não acordaram em transferir grande parte da sua soberania para a União Europeia, pois existem vários (Irlanda, Holanda e Luxemburgo à cabeça) que possuem sistemas fiscais onde a atratividade empresarial é muito grande, beneficiando de deslocalizações empresariais dos seus parceiros europeus.
Recentrando na decisão da Jerónimo Martins, na minha opinião a questão assenta em três pontos:
a) Eticamente, e de agora em diante, os gestores de topo do grupo do grupo deveriam abster-se de emitir qualquer opinião sobre a condução económica do país, uma vez que contribuíram, no seu quinhão, para o seu agravar;
b) Socialmente, o exemplo de "fuga aos impostos" é claro, contribuindo para a imagem, formulada pelo cidadão comum, que neste país os ricos são sempre poupados (lembrei-me da máxima do PREC "os ricos que paguem a crise", e sabemos onde isso nos levou...);
c) Fiscalmente, o seu exemplo e o de todas as empresas que deslocalizaram a sua sede para a Holanda e outros países fiscais, leva a um acréscimo permanente da carga fiscal sobre os "tansos fiscais", como dizia Leonardo Ferraz de Carvalho, isto é, aqueles que não conseguem replicar este exemplo vindo de cima.
Duvido, em conclusão, que este tema ainda esteja em cima da mesa daqui a algumas semanas, quando a indignação mediática passar e a espuma dos dias se dissipar...

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